quarta-feira, 11 de outubro de 2017

A VIDA E SEUS OFÍCIOS: A PRODUÇÃO CÊNICA E A DANÇA



O ofício da dança está relacionado à produção / materialização de cenas. Dobramos-nos e desdobramo-nos para isso. Esse texto é um escrito muito simples, em homenagem e reconhecimento aos trabalhadores que tornam possível que as ideias saiam de seus esboços e venham a termo, para serem compartilhadas.


Este texto foi escrito numa manhã de quarta-feira chuvosa em Porto Alegre, em que preparo uma aula da disciplina Produção Cênica, para os alunos do Curso de Licenciatura em Dança da UFRGS.

Seja qual for o âmbito da produção cênica em dança, diria que é um constante exercício de fôlego, de criatividade e de paciência. Labor minucioso se quisermos alçar voos mais altos, de modo a podermos materializar o idealizado. E, sobre o idealizado, por favor, não o subestimem! Idealizar é imaginar; é povoar o imaginário com imagens/cenas (im)possíveis. Imaginar é, ainda, criar um desejo, um plano a priori. Imaginar é também estar aberto para que o a priori se redimensione, a partir do momento em que começarmos a colocar ‘a mão na massa’ para realizar – e termos fôlego para imaginar bem rápido outra solução. O que podemos chamar de improvisação, na verdade são pequenas imagens e planos prévios que se anunciam e se reorganizam velozmente à imaginação, quando temos um intuito, ou, algo que nos mova a realizar.

E o que nos leva a querer estar nesse ofício, de produzir cenas? O que é necessário?
Volto à palavra paciência. Todos os dias. Fazer. A mesma coisa. A mesma coisa?
Será que, ao repetirmos uma cena [como bailarinos, atores, ensaiadores, diretores etc.], ou, ao viabilizarmos uma luz, um figurino ou um cenário para a cena estaremos fazendo a mesma coisa? Ou estaríamos, nós, atravessando novamente a corda bamba?
Sim, a tarefa pode ser "atravessar a corda bamba"... Mas, se tivermos que fazer essa tarefa todos os dias, a cada dia será preciso atualizar o modo de inventar esse fazer.
Para isso vamos desenvolvendo artimanhas - que, ao fim e ao cabo, chamamos de técnica(s). 
Essas artimanhas são atalhos. E, com esses atalhos [que se redimensionam, todos os dias, no próprio exercício do trabalho], podemos começar a jornada incessante de encurtar as distâncias entre intenção e gesto [tarefa de vida inteira, diga-se].
Na dança nada está dado. Podemos ter indicativos do que fazer, mas, até nos protocolos mais rígidos, esse fazer carece de nossa (re)invenção, a cada dia. Dessa maneira, "aquilo que não veio", ou "as defasagens" [citando uma ideia de José Gil, no artigo "O Gesto e o Sentido", no livro Movimento Total (São Paulo: Illuminuras, 2004)] são aspectos que nos movem a continuar.
Esse desejo de produzir e formar cenas nos torna (im)pacientes: como se fôssemos inquietos e resignados, ao mesmo tempo, pois, como já escrevi num poema "o corpo não se conforma" (em CORPO = MATERIAL).

*Luciana Paludo, 11 de outubro de 2017.

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